sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Coffee break

Inspirado pelo blog da Mª José, venho aqui fazer uma espécie de ode prosaica a um momento que faz parte do quotidiano da maioria das pessoas, em especial do povo lusitano. Talvez por ser um momento banalizado acabam por não vislumbrar tudo o que o rodeia mas uma observação mais atenta dará para sentir que aquele momento desperta e agita bem os nossos 5 sentidos. Chávena na mão, o aroma em vapor que se liberta e inebria a atmosfera, cresce água na boca de todo um corpo em ansiedade para que o líquido esteja na temperatura certa e logo a seguir entrar em êxtase interior saciado pelo sabor cremoso… é incrível como um simples café tem um poder tão forte para despertar todo este plaisir. Já percebi que insinuei apenas 3 dos sentidos mas o resto vem logo a seguir quando se volta a pousar a chávena e os sons das conversas das mesas vizinhas, a música ambiente, o ritual das etapas que o barman impõe à máquina para mais uma tiragem, o motor dos carros que passam na rua… todos estes sons vão subindo de forma crescente e límpida aos ouvidos assim como mais transparentes são as imagens que os olhos captam, seja a decoração das paredes de um café urbano, sejam as pessoas em movimento na praça central da vila, seja o movimento das cartas ou das pedras de dominó a sair das mãos ásperas marcadas por uma vida de trabalho de velhos de uma aldeia pacata, seja o infinito azul que se estende desde a esplanada junto ao mar ou o verde e castanho que se eleva serra acima.

Pergunta quem não é adepto do café o porquê de estar a ler estas palavras. Resposta simples, o prazer é o mesmo levando à boca um chocolate quente ou capuccino, um chá quente ou frio, um copo de vinho ou cerveja, uma simples água com ou sem gás, um refrigerante ou sumo natural, um batido ou um jarro de sangria,… e todo este prazer sozinho ou partilhado com um cigarro entre os dedos, um jornal aberto, capítulo de um livro ou com alguém batendo um papo…

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Saudades do sol e não só...

Olho para o fundo do ambiente de trabalho do meu computador e vejo-me a esbracejar para a objectiva da máquina fotográfica, sentado na água irresistível para a pele que nem dá sinal de si tal a absorção em que se encontra, não tanto para os olhos que reclamam os elevados níveis de sal mas que as papilas gustativas já provaram indiferentes ao que pode acontecer ao nível de tensão. Encontro-me a uns bons 50 metros da areia enxuta, com salpicos cor-de-rosa que o mesmo sal lhe confere. Os muitos tons de azul fazem a sua escala, apenas interrompida por pequenas ilhas que cercam a praia e por sua vez cercadas pelos iates que vão estacionando…
Estou na Playa de Ses Illetes onde não é possível resistir à tentação de apregoar a perfeição do Planeta Azul. Já lá vão alguns meses, agora tenho o frio a espreitar pela janela e a provocar-me um arrepio de saudade pelos dias lá passados e uma súplica pelo próximo sol quente, algures escondido atrás das nuvens que passam a correr sobre o céu de quem circula na rua; é a altura ideal para escrever algo sobre duas ilhas Baleares fantásticas: Ibiza y Formentera.
À saída do avião, a brisa quente e seca que sopra, depois do arrebatamento das cores do mar vistas do ar, é a prova final de que estamos algures perdidos no Mediterrâneo. Com a chegada ao quarto do hotel, uma sensação desperta para uma corrida até à varanda onde a batida da música que vem do outro lado da rua invade qualquer um e passa a controlar todos os movimentos - é o som único das Ibiza Summer Sessions. Avista-se malta jovem mexendo-se ao ritmo certo, de forma bem ousada vão fazendo o jogo da sedução e facilmente se verifica que a ilha serve intentos tão díspares como passar uns dias cheios de programas bem românticos ou conhecer pessoas novas e dar largas à imaginação, começando por beber um copo de cada vez nos muitos bares com propostas bem diversificadas e acabando as noites encharcados pela espuma que algumas discotecas oferecem. Ibiza não é um sítio, é um estado de espírito. As suas praias também contribuem para esse sentimento, mas nesse domínio a vizinha Formentera constitui-se como uma pequena mas valiosíssima pérola!

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Como é que eu poderia esquecer o Porto...

Este texto é especialmente dedicado ao meu amigo Milton que insinuou um dia destes a minha traição à cidade do Porto quando me ouviu dizer algo assim parecido “Lisboa é única no país porque tem sempre algo de novo para surpreender”. Vou mostrar-te que não é verdade e que continuo apaixonado pela muy nobre e invicta.
A mesma tem muitas portas de entrada, as mais encantadoras são oferecidas a quem vem de sul pelas várias pontes que cruzam a grande altura o Douro que mantém o seu bailado desconcertante por entre encostas curvas. A minha sugestão só podia ser a do Carlos Tê que escreve assim para a voz de Rui Veloso “Quem vem e atravessa o rio, junto à serra do Pilar, vê um velho casario, que se estende até ao mar”. Pode-se fazê-lo de metro mas o melhor mesmo é a pé para dar tempo suficiente às cores da Ribeira invadirem os cinco sentidos, ali imóveis no meio do tabuleiro superior da D. Luís I, qualquer um tende a suster a respiração para se sentir transportado para aquele quadro pintado por gente simples, com pronúncia do Norte, dialogando sonoramente entre peças de roupa agitadas ao vento, suspensas em arames presos a varandas de casas encavalitadas, umas quase beijando o rio que de quando em vez lhes deixa a sua marca, outras galgando a colina até à Sé. Ao observador mais atento impressiona a quantidade de igrejas que a custo irrompem com as suas torres por entre aqueles cogumelos pintados em aguarelas de mil cores.
E se a ideia do visitante é percorrer a monumentalidade, o Porto não desilude, podendo circular pelo pátio exterior da Sé, em torno do pelourinho, invadir o espaço interior, descer à estação de comboios de São Bento e deixar cair os queixos perante as gravuras de azulejo que revestem as suas paredes, subir a Avenida dos Aliados sempre com os olhos postos nas fachadas e cabeços dos edifícios que a ladeiam, flectir à direita e seguir com os ouvidos o rasto das apregoadoras do Bolhão, ou se preferir outras compras, percorrer a Santa Catarina mesmo que só para sentir a atmosfera dos passos cruzados da multidão, com o valor acrescentado que esta época proporciona com o cheiro da castanha assada e eis que se chega à praça da Batalha, rodeada por salas históricas de cinema e teatro, não esquecendo o Coliseu que do alto da sua rua observa o Rivoli com o qual a partilha.
Mas uma jornada destas já com algum peso nos músculos das pernas não deixa o viajante seguir em frente quando passa pelo Majestic sem ceder à tentação do convite das suas cadeiras para o cimbalino. Fazendo o percurso de uma parábola com concavidade positivamente voltada para o céu, chega-se à Torre dos Clérigos e o esforço das centenas de degraus é refrescantemente compensado não por uma laranjada servida na varanda mas por tudo o que está sob os pés nos 360º que um movimento de lenta rotação permite alcançar. Na descida é de lamentar a ausência do Jardim Romântico que outrora se estendia desde o sopé da torre e que um dia se tornou presa fácil da ridiculamente poderosa e cruel mão humana. Nas imediações resiste um parque com árvores acompanhadas de umas peças de arte em ferro curiosas e, num dos seus limites, mais uma igreja de azulejo vestida, como é bem característico em muitas que se distribuem pelo burgo. Mas quem está naquele local não pode afastar-se sem uma incursão na livraria Lello & Irmão onde os livros trazem um sabor diferente mas isso já é algo que aqui não se pode descrever, o melhor é entrar… e porque não um salto ao Piolho onde enquanto se degusta um petisco se pode encostar a orelha à parede para tentar escutar murmúrios de planos e conspirações de outros tempos ou apenas para brindar com um fino ao espírito académico.
O tempo passa e o melhor é descer por ruelas enviesadas que contornam edifícios que se esmagam mutuamente, desembocando no largo com honras feitas pelo Palácio da Bolsa com o seu magnífico salão árabe embora triste e eternamente associado ao facto de ter sido construído de forma perversa que quase estrangulou a existência da Igreja de São Francisco na altura em que os seus moradores, da ordem homónima, receberam o veredicto de saída, restando à mesma uma curta vista para o rio, e por isso mesmo, passando muitas vezes despercebida. Mas, fazendo jus ao título de maravilha candidata, é de visita obrigatória. Quem desce estas ruas pode escolher a noite de São João, desde que esteja preparado para o amasso e para as inevitáveis marteladas e snifadelas de alho-porro.
Voltando lá acima porque não vaguear nos jardins do Palácio de Cristal? E em pouco mais de quase nada chega-se à mais famosa rotunda da cidade em cujo centro se avista no alto um leão com as garras afiadas sobre as penas da águia, não retirando aqui quaisquer ilações pois estou numa posição neutral em relação a esta disputa. Numa das saídas destaca-se a Casa da Música, edifício polémico pelos atrasos no timing de construção e (a)normais derrapagens financeiras infelizmente comum a muitas obras públicas mas de inegável singularidade arquitectónica, que se junta ao (já que se meteu a colherada no futebol) Estádio do Dragão no que concerne a beleza dos novos padrões de construção. Tenho esta opinião totalmente isenta pois se cá no íntimo não gostasse da obra, era o primeiro a maldizer tal como o faço sempre quando as coisas não andam bem pela naçon azul. Polémicas à parte fazemos bem em descer a Avenida, e como é a maior que eu conheço no país, o melhor é parar a meio para lamber o beiço ao devorar a francesinha do Cufra. Bem sei que os gostos não se discutem mas esta faz parte do top de qualquer apreciador. Não esqueci as tripas mas pode-se deixá-las para o fim da volta ao regressar à Ribeira.
Retomando a mesma avenida, vale bem a pena fazer um desvio à esquerda para uma entrada na Casa e um mergulho nos Jardins de Serralves. De repente sente-se que a presença momentânea numa cidade talvez não esteja a passar de um sonho, até ser interrompido pela passagem a alguns pés de distância de um avião a aproximar-se do seu poiso. Antes do Castelo do Queijo, agredido pelas ondas do Atlântico que as inventa para chamar a atenção, impõe-se um passeio no Parque da Cidade para abrir os pulmões e retemperar energias.
E dando a tão pedida atenção a esse mar egocêntrico ao circular pela marginal da Foz, o passeio continua bem agradável e quando se dá conta já não é mar mas o seu enlace com o rio. A bicicleta é o meio ideal para seguir caminho mas uma viagem de eléctrico dá uma expressão pitoresca ao que falta palmilhar. Surge então a Ribeira com os rabelos e outros tipos de barcos sem passado atracados no cais a oferecerem o cruzeiro das pontes, uma forma diferente de se ver a cidade.
Outros sítios emblemáticos ficam por referir, entre palácios, museus, ruas, jardins, lagos, pátios habitados por pombos, estátuas de cavaleiros, de poetas, carteiros ou ardinas… mas neste momento o melhor mesmo é atravessar para Gaia onde as caves esperam com um copo de vinho do Porto para brindar e, já se sabe, quanto mais velho melhor…
Agora Milton, vou pensar se te perdoo, não a acusação com que eu começo este texto, mas o facto de teres depreciado tanto o papel da minha diva Meryl Streep no “Mamma Mia!”, onde até deu um novo encanto à minha música preferida dos Abba “The Winner Takes It All” quando a interpretou com voz rouca e nostálgica, emoldurada por indescritíveis paisagens gregas, a mesma nostalgia que eu tenho ao escrever sobre o Porto a partir das vistas do meu quarto sobre Lisboa. Talvez o que te tenha ferido seja o facto de os Abba serem aquela banda que deixou uma marca, uma herança, talvez a despedir-se do seu público no momento em que nasceste mas logo ali te ficou no ouvido e cresceste numa adoração também crescente às suas músicas e, sendo para ti obras-primas, ninguém deve ousar proferi-las em vão. No meio de toda esta confusão sobra-me o discernimento para te agradecer o contágio que me passaste ao longo daqueles anos de convivência quase diária de Aveiro para crescer em mim uma admiração por estes 4 suecos que passaram que nem um tornado por este mundo, deixando uma indelével e irracional marca, desaparecendo de seguida quiçá para passar o tempo em jogatinas de sueca a 4.